sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Sonho 3


Por Carolina Peixoto

Eu vi um sonho assim:

Estávamos em um almoço grande, com muitos convidados. Eu andava em meio às pessoas procurando conhecidos. Eu via grupos reunidos conversando, eles gesticulavam muito e as pessoas falavam quase todas ao mesmo tempo. Havia uma tensão no ar. A reunião era um encontro da “resistência” ao novo governo recém eleito. Eu andava e podia ver nos olhares e nas expressões dos rostos o medo, a incerteza e a revolta. Enquanto me esgueirava contornando os grupos, pensava que talvez estivéssemos revivendo os sentimentos de 64. Meu coração estava acelerado. Eu procurava o rosto do meu marido. Quando consegui chegar num espaço um pouco mais amplo, o vi de longe. Estava próximo de um muro muito alto que separava o jardim da calçada. Assim que o encontrei com os olhos, dois homens entraram e o pressionaram contra o muro. Meu alívio se transformou em pânico. Eu sabia o que estava acontecendo. Ele seria levado. Todos sabiam que os prisioneiros eram levados ao “cadeião” e depois disso nunca mais os víamos. Fiquei paralisada olhando a cena de longe. Podia sentir meu peito inflando mas sufocava de medo. Tive o impulso de correr e gritar, mas a razão me dizia para não fazer. Se o fizesse, seria pega junto. Provavelmente eu estava sendo procurada também. Dei dois passos para trás devagar, me misturei aos outros convidados até chegar em um portão lateral. Assim que saí à rua, corri com toda a energia que pude sem olhar para trás. Corri esbaforida até chegar ao centro da cidade e entrei em uma loja de roupas baratas e me escondi num labirinto de araras lotadas. Fiquei ali, soterrada pelas roupas e pelo calor tentando recuperar o fôlego até que o pânico foi interrompido pela vibração do celular. Uma mensagem recém chegada dizia: PROCURE FRANCO. LUIZ LORÉA, 158. Meu rosto se iluminou. Entendi que os companheiros do almoço estavam me ajudando e senti de novo a esperança que movia o grupo. Havia chance e eu agora sabia o que fazer. Saí à rua e voltei a correr.

Então eu abri meus olhos e despertei.

Nenhum comentário:

Postar um comentário